segunda-feira, 7 de maio de 2012

Campanha contra a chatice


Há algum tempo, venho observando, no Facebook, o crescimento de campanhas a favor da língua portuguesa, com o intuito de "ensinar" as pessoas a escreverem melhor. Ou direito. Sei lá. Coisas do tipo. Gente tentando "corrigir" quem comete algum desvio em relação à norma culta.  Pessoas que se sentem autorizadas a dizer pra outras que "de repente" se escreve separado, que "intaum não é "então", que "ansiedade" se escreve com "s" e por aí vai. Gente que aconselha outras a usarem o "Pai dos Burros" antes de escrever "bobagem" em sua página. Ô pessoal, menos, né... Arrogância tem limite. E chatice também.

 

Conforme muitos sabem, fui, durante muitos anos, professora de língua portuguesa. Há quatro fora das salas de aula, hoje me dedico quase que exclusivamente ao trabalho de revisão para revistas, periódicos e afins. Sou uma "caçadora" de erros, já que o meu trabalho exige que eu não os deixe passar. Sob hipótese alguma. É para isso que eu sou contratada. E bem remunerada. Graças a Deus! Estou falando de revistas que levam o nome de suas empresas, divulgam o trabalho que elas realizam e têm, claro, um compromisso com a qualidade de seus textos em todos os sentidos. São muitos os profissionais envolvidos para levar conteúdo de boa qualidade ao público a que se destinam. E, aí, claro, o rigor com as normas da língua se faz mais que necessário. É preciso estar atento a tudo para que o resultado final seja o melhor possível.

 

Porém, seja qual for o texto a ser escrito, é muito importante que sejam observadas as condições de produção. A quem ele se destina? Com que finalidade está sendo escrito? Onde será publicado? Qual será o gênero (crônica, artigo de opinião, conto, reportagem, notícia, bilhete, e-mail...)? Antes de começar a escrever o que quer que seja, é importante que isso esteja claro para o "autor", para que ele possa, enfim, dar início à redação do que se propôs. Não há um jeito único de escrever; antes, é preciso observar quais são as condições em que o texto será escrito. Do contrário, corre-se o risco de produzir algo inadequado, desinteressante e sem propósito  para quem vai ler. Um mesmo conteúdo, dependendo das condições expostas acima, vai ser tratado de formas muito diferentes. Sem que haja, necessariamente, uma melhor que a outra. 

 

O ambiente virtual tem características muitas peculiares e curiosas. Por ser dinâmico, a agilidade é uma de suas principais marcas. Em função disso, a economia de letras e palavras tornou-se um traço marcante. Abrevia-se muito, os acentos são, por vezes, esquecidos, códigos próprios de escrita são criados a todo instante. Curiosamente, a despeito do grau de escolaridade, da condição social ou de qualquer outro aspecto diferenciador, ali, dentro daquele espaço, todos se entendem. Por mais erudita que seja a formação de um "amigo", nas redes sociais, ele é igual a todo mundo. As diferenças acabam se dissipando. Eu mesma, apesar do trabalho "fiscalizador" que tenho, em minhas postagens, abrevio, uso muitas reticências, exclamações, repito várias vezes uma mesma letra para dar ênfase a algo que desejo ( Creeeeeeeedo!!!!!)...Só não cometo desvios ortográficos porque conheço o idioma. Caso tenha dúvidas, troco a palavra por outra ou pesquiso no dicionário. Sim, eu o consulto quase que diariamente. Várias vezes. Afinal, ele não é um livro para ser lido, mas consultado sempre que necessário.

 

Em função disso, sinto-me extremamente incomodada com essa patrulha dos pseudofiscais da língua que se instalaram no Facebook Pessoas que corrigem anonimamente outras numa postagem, porém, na seguinte, deixam de concordar verbo com sujeito. Até porque, na maioria das vezes, conhecem pouco o próprio idioma – embora se sintam muito confortáveis em dar lições e fazer repreensões públicas. Não estou aqui defendendo que saiamos por aí cometendo infrações linguísticas. Ou que passemos todos a escrever sem observar a norma padrão. Claro que não. Certamente, os códigos linguísticos empregados nas redes sociais mostram-se inadequados para serem usados fora delas. Mas, dentro do ambiente virtual, funcionam.Se você, assim como eu, não quer escrever nada errado, faça um esforço para isso. Pense antes de escrever e, se possível, releia pra ver se está tudo "dentro dos conformes". Entretanto, deixe as lições de boa escrita guardadas para você. Contenha-se. O mundo já tem chatos demais pra você querer aumentar as estatísticas.

 



4 comentários:

  1. Liza, adorei o texto :)
    E me lembrou muito o que o Veríssimo diz no Gigolô das Palavras, que caiu no concurso da Petrobrás que fiz ontem (que coincidência). É muito comum esses "donos da língua portuguesa" cometerem equívocos ainda piores do que os que acabaram de criticar.
    Beijão e parabéns pelo blog!

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  2. Mãe, concordo que é muito chato ficar corrigindo os outros se achando o dono da língua portuguesa, sendo que quando vai escrever um texto comete diversos erros. Mas as vezes irrita o jeito de escrever da pessoa, não uma palavra errada, por que errar todo mundo erra, mas as pessoas que não sabem a hora de usar, por exemplo, pessoas que ao invez de escreverem você, ou vc, como a maioria, escrevem "vs". Como assim? "Vesus é chato!". Aí já acho invenção de moda hehe Mas concordo com você, beijos.
    www.guitarra-imaginaria.blogspot.com.br

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  3. Adorei! Como sempre escreveu com muita propriedade. Beijos...

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